29 fevereiro 2024

Como vestir o chapéu quando o motivo de vesti-lo não se realiza (e Julieta, presente)

A semana 17 por Patricia Galleto

Nesta semana introduzimos mais um elemento na cena: o chapéu. Vale lembrar que temos trabalhado a partir da peça Esperando Godot, do Beckett, como contamos nas publicações anteriores. Em nossa cena, Gina atua basicamente em três eixos: procurar moedas em si mesma; arrumar-se para ir (não sabemos aonde); esperar algo ou alguém (não sabemos o que ou quem). Como explicou Dinho no último texto, partimos da premissa do não acontecimento presente em Godot. Nesse não acontecer, a palhaça desenvolve essas ações, indo de uma a outra e repetindo-as de diferentes maneiras.

Foto: Ivna Messina

Durante esse processo, inserimos elementos de vestuário, como o casaco e, agora, o chapéu. Resolvemos seguir de forma muito semelhante à que fizemos com o casaco. Exploramos algumas possibilidades de manipulação do objeto improvisadamente para, então, elencar as possíveis ações e truques com o chapéu. Desta vez, recorri a tutoriais no YouTube, já prevendo a minha falta de habilidade com malabarismos e efeitos de virtuose. Mesmo com o tutorial, a dificuldade permanece. Talvez não tenhamos o tempo necessário para treinar os truques elencados, mas procuramos focar aqueles que parecem ser mais simples, apenas para dar algum brilhinho na ação de vestir o chapéu em meio à espera e à preparação para a saída – e também porque essas ações de Gina é tudo o que “acontece” enquanto o que seria um acontecimento maior não se realiza nunca. A cena, a vida, é o durante.

Dinho aponta que esse momento de vestir o chapéu será o último antes de finalizar a cena (Gina deverá de fato sair, primeiramente porque é necessário um desfecho sem recursos de luz, e, dramaturgicamente, palhaços costumam ter a saída de cena como uma etapa importante do número – geralmente envolta em uma espécie de ápice –; em segundo lugar, porque, como eu e Dinho conversamos, a espera do quase tedioso “nada a fazer” presente em Godot é, na realidade, uma espera burguesa, que não condiz muito com a nossa realidade latino-americana, em que a fome reclama e sobreviver é uma necessidade diária).

Por fim, entre os objetos inseridos na cena está, em um dos bolsos de Gina, um especial, que vale o destaque aqui – um nariz de palhaça. Não de qualquer palhaça. Na cena, ele aparece brevemente como o nariz de Julieta, o nariz de Miss Jujuba. Uma singela homenagem àquela que não está, que não vai chegar, mas que ainda assim se faz presente em todas nós mulheres, palhaças, em nossas atividades e em nossas vidas. Julieta, presente!

E, para os que se divertem com mesóclises, digo: tornar-se-á indispensável a fluidez de manipulação de todos esses elementos na cena para que consigamos o ritmo e a intenção desejados. Além disso, temos como próximo passo a afinação dos momentos em que a espera/procura pelo(a) Godot é evidenciada através de falas pontuais de Gina.

Então treinemos e sigamos! 

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(Ainda não) é o fim!