05 dezembro 2023

O que fazer com o corpo?

A semana 10 por Patricia Galleto


No trabalho com Antígona, na cena que estamos criando, há um corpo, que seria o de Polinices. No entanto, esse corpo não tem características realistas; ele consiste basicamente numa bola de tecido envolta por um edredom amarrado, fazendo o que seria o equivalente ao pescoço. Num primeiro momento, Dinho me deixou livre para experimentar possibilidades de interação com nosso corpo-edredom. 

O que eu tinha para usar como norteador era a premissa de que a soldada Gina, diante da descoberta das honras fúnebres feitas a Polinices – aqui concretizadas na presença de velas e de uma planta seca –, estaria em pânico, sem saber o que fazer nessa situação, que, na verdade, acabaria lhe trazendo algum castigo terrível. Afinal, ela havia fracassado em sua missão de impedir que tais honras fossem concedidas.

Esse estado de pânico foi conduzindo a experimentação, que nos levou a tentativas da palhaça de esconder o corpo, esconder as velas e a planta, encontrar saídas e justificativas, explicar-se de alguma forma, até mesmo se fingir de morta junto com o morto (e depois no lugar dele). Vale lembrar que, como explica Dinho no post anterior, temos a presença de um “Jorge” na plateia, que seria qualquer pessoa do público para quem Gina olha com desconfiança e medo, como se essa pessoa fosse seu dedo-duro e fosse contar para Creonte que sua guarda não tinha evitado que as honras fúnebres fossem feitas. Em suma, “Jorge” funcionou como o ponto de apoio da cena, e era principalmente para ele que as tentativas da palhaça de se safar passaram a ser dirigidas.

Uma vez levantadas as possibilidades do que fazer com o corpo e os objetos, elencamos algumas que nos pareceram mais interessantes. Outras sugestões também foram propostas pelo Dinho depois de assistir à improvisação. Ainda sem fecharmos um roteiro de ações, nós estipulamos os caminhos que pareceram funcionar, deixando espaços abertos para o que ainda não sabemos.

Ao mesmo tempo, segurar a cena inteira nesse mesmo estado de pânico em todas as ações nos pareceu um pouco pobre para a palhaça e suas potencialidades de jogo, além de monocórdico dramaturgicamente. Assim, começamos a sublinhar mais conscientemente os momentos em que a palhaça “se distraía” entre uma coisa e outra. Um deles é quando Gina, ao segurar o corpo, brinca com ele como quem brinca com uma bola de futebol (e aqui a palhaça lida diretamente com o que de fato é o objeto, e não com o que ele representa ao longo da cena). Ela entra nesse jogo e sai dele ao ver “Jorge” e se dar conta de que precisa se livrar desse enrosco todo. A ideia é que ela possa criar essas brechas de outros estados de brincadeira e depois voltar àquele que estabelecemos como principal, a angústia de resolver o problema. As nuances da cena começam a ganhar corpo; e o corpo, mais funcionalidade como trampolim para o jogo.

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