A semana 8 por Patricia Galleto
Esperar requer alguma maturidade. Uma criança geralmente tem dificuldade de esperar, de entender e aceitar que nem tudo é pra já, de reconhecer o tempo das coisas. Além disso, esperar requer desvencilhar-se da ansiedade do fazer. Nesta etapa do nosso trabalho, em que partimos de Antígona para a investigação e criação, há um tempo de espera para a palhaça. Na verdade, é uma espera ativa – como em geral são as esperas cênicas –, é mais espera para quem vê do que para quem está em cena. Um “nada” preenchido por microações internas. Disso há um grande acontecimento resultante, que pode ser algum incômodo, talvez, uma suspensão, uma pausa, um tédio, aquilo que surge inesperadamente em quem assiste à espera, e espera junto.
Para não dizer que nada
externamente acontece, há a ação física de ir inclinando o corpo, que está sentado
em um banquinho, começando pela cabeça. Os olhos passeiam por cada pessoa
(imaginária, pois só o Dinho e eventualmente a Gabi observam a cena), com
pequeninas variações, quase imperceptíveis. Até que o corpo se desequilibra e
quase cai do banco, fazendo a palhaça levantar-se rapidamente diante do
imprevisto. Esse corpo é o da palhaça/soldada que chega atrasada ao seu posto
de guardar o corpo de Polinices para que ninguém o enterre e lhe preste
homenagens, como Dinho explica no post anterior. Ao guardá-lo, não há nada a
fazer. Surge a espera.
Ter calma e presença que consigam
dar conta de segurar a cena são os maiores desafios para mim neste momento. Eu,
que frequentemente tenho acelerado as cenas por ansiedade, estou
diante da missão de fazer o exato oposto. Às vezes o que encurta precipitadamente
o tempo dessa passagem é a angústia de estar me estendendo demais, levando o
público à perda do interesse. Por outro lado, parece ser justamente ali onde a
palhaça pode ganhar o público (é uma espécie de ou tudo, ou nada). Trata-se de
um encontro muito mais “desarmado” com as pessoas, através do olhar e da quase nenhuma
ação externa. É segurar pela ação interna. E, nesse caso, ação interna é estar
viva a palhaça, com livre passagem do interno ao externo através dos olhos. Agora
me lembrei de uma das professoras que tive na palhaçaria, que dizia sempre: “brilho
no olhar!”.
Essa cena foi criada em
improvisação na sala de ensaio, e reorientada pelo olhar do Dinho, e segue em
construção por nós dois. De um olhar para o outro, as pontes se estabelecem.
Enquanto cuidamos da cena, exercito os olhos da Gina. Outra memória preciosa
que guardo de aulas de palhaçaria é o clássico exercício de apenas entrar com o
nariz e ir olhando um por um que está na plateia, sem fazer nada, mas
permanecendo vivo e individualizando o olhar para cada pessoa. E cada olhar,
como cada ponte estabelecida, é minimamente diferente. Quem faz esse exercício
pela primeira vez tende a querer se mexer, mover braços, deslocar o eixo, fazer
alguma coisa, criar intenções nas miradas, dizer algo! Quando tudo isso cessa,
o palhaço surge e entra em cena efetivamente.
Nesta cena criada no trabalho com Antígona, sinto como dar um passo atrás (mais uma vez), reencontrando o superdifícil ‘apenas ser’, sem fazer nada, o que, na verdade, é dar um passo adiante, preenchendo a criação com aquilo que é fundamental no fim das contas, em se tratando de palhaços (e, por que não, da vida?): existir, genuinamente, em relação com as pessoas, existir na relação, primeiramente através do olhar. A palhaça olha e vê.
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