A semana 22 por Fernando Marques
Esta semana chegamos ao fim da última cena – e dito assim,
isso talvez dê uma impressão que não é real, de que a coisa foi caminhando
naturalmente para seu final, de forma pacífica e certeira, proporcionando-nos a
plácida sensação de dever cumprido. Mas não.
Primeiro porque tínhamos nos metido no labirinto do qual a
Patricia já tratou no post anterior, tendo chegado ao momento melancólico da
constatação da Gina sobre a própria solidão e não sabíamos como sair dali.
Lembro de chegarmos, na semana anterior, ao final do ensaio com a cena neste
momento (da Gina só) e a Patricia perguntar se eu já tinha alguma noção de para
onde iríamos a partir dali. Nenhuma ideia, eu respondi umas duas vezes. Seja
como for, a coisa seguiu, a Gina adiou a morte e nós continuamos. Ainda não era
o fim.
Então, supúnhamos que tínhamos tudo encaminhado, todas as
cenas levantadas, era só questão de repetir, limpar, ajustar etc. Mas acontece
que Carla esteve na sala de ensaio e assistiu a uma passada da cena que
julgávamos resolvida. E quando, ao final, teceu comentários, a leitura que
tinha feito da cena era algo que estava a quilômetros de distância do que
pretendíamos. Para que se tenha uma ideia, eu e Patricia achávamos que tínhamos
construído algo em que a Gina se desviava da foice do fim e seguia viva, e
Carla nos contava que tinha visto a palhaça no pós-morte. Ok, a gente sabe que
não tem controle – e nem quer ter – sobre as leituras que as pessoas fazem do
que a gente cria. Mas, como diz a Gina em dado momento da cena, tudo tem
limites.
E agora, sim, temos todas as cenas levantadas e o trabalho
bem encaminhado. A bem da verdade, se considerarmos o que o projeto propõe, já
temos tudo feito. Fizemos um processo de pesquisa sobre a dramaturgia da
palhaça, partindo de quatro textos consagrados – Hamlet, Antígona,
Esperando Godot e A falecida – e tratando de temas como morte,
angústia e vazio. E isso tá feito (considerações sobre o que a pesquisa nos
trouxe ainda virão); falta agora só a mostra de processo, um encontro com o
público interessado (se é que ele existe) em ver o que andamos aprontando. E
como é uma mostra de processo, sem o compromisso de espetáculo ou de trabalho
acabado, poderíamos simplesmente mostrar o que temos do jeitinho que está e
abrir o debate com as pessoas que porventura apareçam – caso isso aconteça.
Mas não. A gente quer dar um mínimo de acabamento às cenas,
tornando a coisa agradável para quem a ela assista. Repetir, limpar, testar,
mexer. E há ainda objetos de cena que foram improvisados ao longo do processo e
que agora serão – assim esperamos – resolvidos. Temos ainda meio mês para esses
ajustes e, depois disso, o encontro com o público (que a gente nunca sabe se
aparecerá ou não). Portanto, ainda não é o fim.