08 fevereiro 2024

Partitura corporal e um respiro para o nariz

A semana 15 por Patricia Galleto

Bota o casaco, tira o casaco, coloca-o ao contrário, ele desliza sobre os braços, algo se perde em seus bolsos, torna a vesti-lo, torna a tirá-lo. O trabalho a partir de Esperando Godot, que teve início com a relação de Gina com seu sapato – mais precisamente com algo que incomodava seu pé dentro dele –, seguiu, agora, com a experimentação com o objeto casaco (que, na verdade, é um blazer que já foi figurino da Gina no começo dos tempos!).

Trilhando um caminho diferente dos processos anteriores da pesquisa, partimos da ideia de criar uma partitura corporal, uma sequência de movimento, para aí ver para onde isso nos levaria, quais intenções preencheriam essa relação com o objeto, qual dramaturgia poderia surgir dali e como isso tudo dialogaria com a obra de Beckett, ou com o suco que extrairíamos dessa obra. 

Iniciou-se, então, minha missão particular de estudar as possibilidades físicas com o casaco, mapeá-las e ver como poderiam ser executadas tecnicamente. Esse foi o dever de casa proposto por Dinho, que sinalizou que eu não precisaria me preocupar com a ligação dessas “partes” que seriam descobertas. Isso ficaria para um segundo momento, assim como preenchê-las de sentidos que nos servissem.

Esse procedimento de começar mais friamente por uma sequência de movimentos me fez lembrar alguns processos criativos que experimentei com a mímica. No nosso caso, aqui, optamos por fazer essa investigação e esse mapeamento sem o nariz inicialmente. E assim levantei algumas ações que me pareceram, além de motivadoras para possíveis jogos com o objeto (considerando, sim, a lógica da palhaça), favoráveis à construção de um ritmo para a cena, que foram:

Usar casaco ao contrário;

Escorregar casaco pelos braços;

Usar num braço só;

Perder a mão no bolso, procurar a mão;

Escorregar de novo casaco, trocando de braços;

Colocar com os braços trocados;

Girar o casaco sem vesti-lo;

Embolar na mão;

Amarrar na cintura.

Inevitavelmente, no entanto, pensei na ligação de uma ação a outra, o que me ajudou a estruturar esse experimento como uma sequência uma pouco mais “azeitada”, que será apresentada ao Dinho na próxima semana (e, provavelmente, reestruturada). Aproveitei meu trabalho sem o nariz para também decupar a relação com o sapato, que havia sido criada na semana anterior – na ocasião, já com o nariz e sem partir necessariamente de uma execução técnica da ação, diferentemente do que estamos fazendo com o casaco.

O trabalho sem o nariz me pareceu importante para desenhar um escopo dentro do qual Gina poderá passear e recriar até mesmo os movimentos previamente mapeados, recheando-os com intenções, personalidade, mudando ou não o rumo da prosa, estabelecendo um ritmo e uma lógica. Somar-se-á a isso a costura dramatúrgica do Dinho. Ao menos esses são os planos! Por enquanto, neste momentinho exato, eu olho para o processo mais como intérprete e menos como palhaça. No final, uma vai ajudando a outra.

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(Ainda não) é o fim!